terça-feira, 31 de janeiro de 2012
Era kinder mas não foi surpresa
Ir ao médico por estar maldisposto do estômago e ser atendido por um sô doutor a comer alarvemente um chocolate kinder está ao mesmo nível de ser alcoólico e ser ouvido por um médico a beber um cálice de vinho do Porto ou ter uma dst e ser atendido por um médico a fazer o amor com a secretária sem preservativo...
É uma coisa que não se faz ao pior dos criminosos.
Mas pior do que isso, foi quando o homem, após engolir a barra de chocolate, praticamente de uma vez só, me perguntou com a voz colocada:
"Então e o que é que sente?"
Foi aqui que percebi que o médico não devia ser grande coisa. Se fosse, não precisaria de perguntar, porque saberia perfeitamente que o que eu estava a sentir era uma salivação do caraças e uma inveja difícil de imaginar...
Não, agora a sério. O homem é bom médico sim senhor. Percebeu que eu não devia estar bem do estômago e, de certeza que foi por isso, não só não me perguntou se eu era servido como ainda escondeu o resto da tablete no saco térmico, para me ajudar a resistir à tentação do chocolate.
E tinha razão. Quando saí, senti-me logo muito melhor.
sábado, 28 de janeiro de 2012
Os amigos do Passos Coelho medem 2 x 1,5
Há dias ia, muito descansadinho, de passagem por Lisboa, quando eis que, a sair de um restaurante de comida africana da moda, vejo o nosso primeiro, o distinto Dr. Passos Coelho.
O facto do homem se alimentar em restaurantes africanos não me admirou. Ou não fosse ele o homem que um dia se auto-intitulou "o mais africano de todos os candidatos a 1º Ministro".
O que me admirou foram os amigos com quem ele estava. Eram uns 4, todos com 2m de altura por 1,5m de largo, de fato e óculos escuros. Eu que sempre imaginei que os amigos de alguém como um enfezado Primeiro Ministro fossem pessoas com ar de extrema cultura, não consegui deixar de ficar surpreso por afinal terem aspecto de extremo culturismo.
Mal saíram do restaurante foram, extremamente apressados, para os carros de alta cilindrada. Os amigos dele devem viver bem. Dois Mercedes topo de gama daqueles não são para os bolsos de qualquer um. E nem sequer deixaram o Passos Coelho ir à frente. É o problema de um gajo ter amigos maiores. Eu sei bem o que isso é. Na Faculdade, como eu era o mais pequeno dos meus colegas, também ia sempre atrás...
Mas pronto. Tou para aqui a falar dos amigos dele e eles, coitados, devem ter problemas de saúde. Todos tinham aparelhos auditivos e um tique esquisito: estavam sempre a olhar em redor. Até fazia parecer que estavam com medo que alguém quisesse fazer mal ao amiguinho Passos.
Enfim, toda a gente sabe que o Passos Coelho só quer o melhor para os portugueses.
Não é?
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
Não percebo nada de crianças, quer dizer, de moda
- O que estás a fazer, tio?
- Estou a desenhar-te. Tens que estar quietinho.
- Mas eu quero ver...
- Vês no fim. Se vieres cá agora não vais ver o desenho acabado.
- Mas eu quero... Buááááá...
- Mas não podes. Já te expliquei.
- Olha, vou ver televisão.
- Nããããããããooooo... Volta cá!
5 minutos mais tarde:
- Ah, voltaste!
- Sim. Deixa ver.
- Olha aqui. Estás parecido, não estás? E tive que te fazer sem estares ali.
- Fizeste-me com cabelo de menina... Buááááá...
- Tem calma. Então não vês que o teu cabelo é assim?
- Ó pai! Paaaaaaiiiiiii! O tio disse que eu tenho cabelo de menina! Buáááá...
- Não disse nada. Mas tens que ver que é parecido com o das menin...
- Buáááááááááááááááá....
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Alguém sabe se o Paco Bandeira acabou com a namorada actual?
O único sítio público onde toda a gente, incluindo pessoal da alta finança, pode ler revistas da imprensa cor-de-rosa, sem sentir a sua dignidade diminuída, é na sala de espera dos consultórios médicos. Primeiro, porque é o único tipo de revistas que existe nesses sítios e, em segundo, porque a alternativa é olhar para o tecto. E isso, conforme toda a gente sabe, cansa o pescoço.
Eu cá não leio esse tipo de literatura de casa-de-banho. Não, não. Eu sou uma pessoa que apenas lê revistas cientificas, políticas e artísticas. O meu nível intelectual não se compadece com menos do que isto.
Só fiquei foi chateado, da última que vez que fui a um consultório, com um senhor todo bem posto, que não largava uma revistinha dessas. Leu-a de fio a pavio, página por página. E, ainda por cima, chegou a minha vez antes do homem a largar.
É que, pelo que consegui ver de relance, tinha um artigo muito interessante sobre música popular portuguesa que queria mesmo ter lido.
domingo, 22 de janeiro de 2012
O que vale é que o homem é doutorado em Finanças
Eu, siceramente, não percebo as pessoas que dizem mal do nosso Presidente ou, como ele próprio se intitula, o Provedor do Povo.
Então o homem, empenha-se pessoalmente em fechar o Acordo de Consertação Social, consciente da importância que isso teria para o país, mesmo sabendo que iria ficar na miséria e ainda por cima é criticado pelo seu próprio povo?
"Ai que ele tem uma reforma de mais de 10 mil euros e não sei quê..."
Eu gostava era de ver as pessoas que o criticam a pagarem o aluguer de uma casa daquele tamanho em Belém, que é só uma das zonas mais caras de Lisboa. É que aquilo tem parqueamento para, pelo menos dois carros, garagem, e um patiozinho, essencial para brincar com os netinhos. E a conta da electricidade que o homem deve ter? Com tantas divisões, coitado, já o estou a imaginar a percorrê-las, todas as noites antes de ir para a cama para se assegurar que não fica nenhuma luz ligada. E o carro? Um Mercedes topo de gama que ele deve ter comprado por empréstimo. Não, é que é aquele tipo de carros que, quando vai à revisão, dá uma dor na carteira, daquelas que se vai para casa e se passa a noite em claro. E, depois, claro, lá está a conta da electricidade a subir... Não deve ser fácil. E quando o Obama lá foi? Eu imagino a conta dos rissóis e dos croquetes. (eu sei bem que isso é porque quando trago amigos cá a casa também não gosto de fazer má figura...) Já para não falar em empregados, viagens, comida, água e não sei o que mais só com 10 mil euros por mês.
Ah pois é, já não parece tanto, pois não?
Ou será que é o Estado que lhe paga as despesas? Não, não...
Se assim fosse, por que carga de água é que o homem se queixaria de receber pouco? Era capaz de ser um bocadito mau gosto...
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
Tou contigo, Capdevilla
Pagar 12 euros para ir ver o jogo do Benfica contra o Santa Clara, para a Taça da Liga, e ver um jogo espectacular, com a equipa a protagonizar grandes lances de futebol artístico, é capaz de ser um acontecimento com a mesma probabilidade de acontecer que ganhar o Euromilhões, com a diferença de que para ganhar o Euromilhões, 2 euros chegam...
Foi um jogo tão fraquinho que, mesmo no estádio houve quem preferisse ficar a ver o Real Madrid - Barcelona na televisão da banca dos cachorros.
O Santa Clara parecia o Liechtenstein, com os jogadores todos à defesa, e o Benfica, uma equipa de suplentes onde todos queriam resolver o jogo sozinhos para mostrar serviço a Jesus.
Aliás, o jogo estava a ser tão mau que eu estou certo que o Jesus meteu 3 jogadores titulares na 2ª parte (Witsel, Nolito e o Rodrigo) para os espectadores não darem o dinheiro do bilhete por tão mal gasto e não saírem do estádio a pensar que no Benfas só jogam coxos.
Pelo menos, a partir deste jogo, tenho a certeza que mais ninguém vai por o Jesus em causa por não voltar a por o Capdevilla a jogar. O homem parece aquelas pessoas que têm um currículo que enche uma capa arquivo mas que quando começam a trabalhar têm um ataque de Alzheimer e só fazem asneira.
Mas no final, fiquei com uma certa simpatia por ele. Quando eu jogava à bola na escola, a partir dos 15 minutos de jogo, também já ninguém tinha paciência de me passar a bola.
Resultado: o Benfica lá ganhou 2-0. Contra o autocarro dos Açores.
quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
O Comboio do Dinheiro, versão portuguesa
Apesar de estar dependente dos transportes públicos, quando me perguntaram se podia estar em Vendas Novas às 15h00, respondi que sim. Uma terra que está a menos de 100km de Lisboa deve ter transportes públicos que chegue, não é? É pá, não...
Levantei-me por volta das 7h30 e, ainda antes de comer, fui ver os horários dos comboios e dos autocarros, para ver qual o que se adaptava melhor. Resultado: Expresso há um a meio da tarde e comboios há dois de manhã (à hora que me levantei já tinha perdido um e o outro estava quase a perdê-lo) e dois de regresso ao final do dia (para quem regressa do trabalho).
A sorte foi que consegui arranjar uma boleia, ainda de manhã, mas mesmo assim perdi o dia todo.
Como lá cheguei 4 ou 5 horas antes daquilo que era necessário, fui dar uma volta à terra à procura de um sitio sossegado para desenhar. A estação dos autocarros estava calma mas nada que se comparasse à estação dos comboios.
Nada, ali não se passava nada. Todas as portas fechadas e ninguém na estação. Até que enfim que o Governo se lembra do pessoal que gosta de sossego e que precisa de um sítio onde estar. Ali sim, há qualidade de vida. Uma estação e um ramal novinhos em folha, requalificados no ano passado (ando bem informado...) que custaram umas boas dezenas de milhões, adaptados a quem gosta de tranquilidade. Tudo bem que têm que lá passar 8 comboios por dia mas pronto, não se pode ter tudo.
Os jardins lá da terra, cada qual com o seu idoso sentado num banco, são muito agitados para mim. Para a próxima, levo o farnel e, à hora do almoço, vou à estação fazer um pique-nique. Antes de dormir a sesta, claro.
domingo, 15 de janeiro de 2012
A malta do secundário
Este fim-de-semana fui para os copos com os meus colegas do secundário. A ideia já andava no ar há algum tempo e, finalmente, acabou por se concretizar.
E confesso que até estava com algum receio do reencontro. Já não via o pessoal há uns bons 4 ou 5 anos e, nestes casos, nunca se sabe muito bem como é que a coisa vai correr. Um dos meus maiores receios era que a conversa não fluísse. O outro, era só que a malta tivesse toda engordado e eu não os conseguisse reconhecer.
Felizmente, correu tudo às mil maravilhas. Tudo bem que não me lembrava do nome de metade deles, mas felizmente tivemos o bom senso de, naquela altura, dar alcunhas a todos, e dessas, ninguém se esquece.
Mas é preciso ver que a coisa foi bem engendrada. Neste tipo de encontros, o importante é que o teor de álcool no sangue acompanhe, na razão inversa, a evolução do nível cultural da conversa.
Começámos por pedir vinho, como pessoas maduras que, já, somos. Quando a conversa acerca da actualização do perfil de cada um (os empregos, as mulheres, os filhos, as casas, os carros, os empréstimos...) se esgotou, já estávamos com um nível de álcool que nos permitiu saltar, com alguma suavidade, para os tempos em que, basicamente, eramos os maiores totós da escola. E foi muito engraçado recordar uma vez em que, em plena praia na viagem de finalistas, eu e mais 2 colegas fomos perseguidos por 3 raparigas estrangeiras que nos convidaram para sair nesse dia à noite e nós recusámos porque... íamos cozinhar bacalhau que tínhamos combinado levar de casa... Não deixa de ser irónico o bacalhau sobre o qual recaiu a nossa escolha. Valha-me Deus.
Aliás, o facto de este reencontro ter sido uma autêntica festa da mangueira, ilustra bem a relação que, naquela altura, tínhamos com o sexo oposto - nenhuma.
Depois de recordarmos os pontos altos da nossa passagem pela escola, o vinho consumido permitiu-nos não cair no vazio e, quase por instinto, começámos a contar anedotas.
Após muitas gargalhadas, apercebemo-nos de que a noite estava a chegar ao fim quando alguém, traído pelo copo, que acabara de esvaziar mais uma vez, contou uma anedota de mau gosto e ninguém se riu. Apesar de todo o tempo em que não nos vimos, mantivemo-nos pessoas com um certo nível cultural do qual nunca abdicámos.
Quando o nível desce abaixo de uma determinada fasquia, sempre soubemos que era a altura de nos despedirmos uns dos outros e ir para casa... tomar guronsan.
Se o entusiasmo não afrouxar, daqui a 2 meses há mais copos. Comigo podem contar.
PS: Eu era incapaz de contar uma anedota de mau gosto como "O que é um anão tatuado? Um abaixo assinado." É que não tem piada nenhuma. Não, a sério. Não tem mesmo.
Pronto, talvez só um bocadinho pequenino. Pequenino e baixinho. Uma autêntica piada de baixo nível. Portanto.
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
A salvar casamentos desde 1982
Aqui há uns dias, estava eu entretido na estação de metro da Baixa-Chiado, quando chega um casal de simpáticos espanhóis ao pé de mim para me pedir indicações.
A senhora, toda afoita, fazendo sinal ao marido para ele a deixar falar, olha para mim sorridente, e pergunta-me do alto do seu portunhol:
"Pór fabór, qual és a mélhór estaçau para a Sé de Lischeboa?"
Ora bem. Se fossem portugueses a perguntar, eu diria simplesmente: "Olha, não sei. Tens ali um mapa do metro na parede onde podes tirar essa dúvida." Como eram estrangeiros, espanhóis, no caso, e a esforçarem-se por falar português, resolvi ficar uns segundos em silêncio, como se estivesse a pensar. Quando achei que já tinha passado o tempo suficiente para eles me acharem um verdadeiro expert da cidade de Lisboa, respondi:
"É esta. Saem e vão a pé."
Na altura quis acreditar nisso mas a forma como a mulher olhou para o marido deu-me logo a entender que tinha dado a resposta errada. A senhora olhou instintivamente para o marido que lhe fez um olhar, do género eu-avisei-te-que-tipos-a-fazer-desenhinhos-são-uns-cromos-do-caraças-mas-tu-foste-teimosa... Ela devolveu-lhe um olhar eu-nunca-disse-que-ele-não-era-cromo-mas-vais-ver-que-ele-sabe e, virou-se para mim, com um olhar ajuda-me-por-favor-se-não-vou-perder-a-razão-e-eu-detesto-perder-a-razão, e perguntou mais uma vez:
"Más nós parécé que debe de haber una más cerca!"
Ciente da responsabilidade da minha resposta na vida conjugal daquele casal, respirei fundo. Não queria repetir a burrice da primeira resposta em que só tinha estado 5 segundos em silêncio, quando, claramente, um especialista na matéria aguarda pelo menos 7 antes de responder. Após esse tempo, empinei o nariz e perguntei-lhe:
"Tem algum mapa da cidade?"
A mulher, revigorada com a pergunta, sacou do mapa de imediato e pô-lo à minha frente. O mapa era muito completo e até tinha as linhas desenhadas. Era só procurar a Sé e a estação que estivesse desenhada o mais perto possível. Ainda pensei responder "Chiça, então nem mapas sabem ver? E depois o cromo sou eu. Sim, sim, que eu bem vos ouvi a pensar..." mas, nesta altura havia já um casamento em causa e, com os sentimentos dos outros eu não brinco.
Mais 7 segundos volvidos e respondi:
"É a do Terreiro do Paço."
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
Nem só de cadernos vive o homem
Já vem sendo hábito. Durante alguns dias de cada mês, acabo por ficar em casa, em total reclusão. Durante esses dias, em que agora estou, não me apetece sair nem falar com ninguém, o humor quase que desaparece, a barba atinge novos recordes, o cabelo ganha vida e sinto dores pelo corpo, especialmente ao nível do rabo.
São aqueles dias. Já me disseram que é normal ser assim, mas custa sempre. E, apesar de custar a passar, eu espero sempre que no próximo mês os volte a ter.
Sim, são os dias em que tenho que acabar um trabalho qualquer de enfiada, porque o prazo de entrega se está a chatear porque tem mais que fazer e quer ir à vida dele.
Quem não percebe é o meu caderno, que tem passado os dias amuado na mesa da sala. Às vezes atira-se para o chão para chamar a atenção, mas já começa a irritar. Acham que uma pessoa tem que estar dísponível todos os dias e não é bem assim. Uma pessoa anda cansada, preocupada com outras coisas e isso tira a vontade. Uma pessoa não é uma máquina.
Esperem lá que já me perdi. Estava a falar de quê?
PS: com um bocadiiiinho de jeito, qualquer dia encontram um livro infantil à venda com esta página lá pelo meio...
domingo, 8 de janeiro de 2012
Isto está a ficar perigoso
Este fim-de-semana fui à ANJE (Associação Nacional dos Jovens Empresários) em Algés, ao lançamento do lado social do projecto Believe, do qual já falei aqui no estaminé. A ideia era só ir lá expor os desenhos que tinha feito no primeiro lançamento (por ocasião do qual tive honras de aparecer na TVI), mas como não tinha nada para fazer antes de começar a apresentação, pus-me a desenhar. Quer dizer, podia ter ido tentar socializar com desconhecidos, mas nisso sempre fui um desastre.
Sentei-me num sofazinho do hall de entrada e saquei do papel e do porta-minas. Estive ali a desenhar mais ou menos 5 minutos e, durante esse tempo, o cavalheiro do sofá à minha frente mal se mexeu. Quando as pessoas mal se mexem, isso pode acontecer por dois motivos: o primeiro é porque, na verdade, são estátuas e, o segundo, porque sabem que estão a ser desenhadas.
Neste caso, o motivo foi o segundo. Mal acabei o desenho, o senhor virou-se para mim e exclamou, num tom de voz colocado:
"O sôr..., o sôr é como aqueles dos tribunais!"
Ia eu para responder que sim, quando comecei a pensar. Os tipos que desenham nos tribunais, estão ali para desenhar os, alegados, criminosos. Ora, eu estava a desenhar um homem que me comparou, ele próprio, aos tipos que desenham criminosos, sabendo que eu o estava a desenhar a ele...
Antes que os pensamentos me invadissem ainda mais e atingissem níveis de estupidez nunca antes registados, reuni a mim todas as minhas forças, e, cheio de coragem, olhei o homem nos olhos. Sorri-lhe e acenei-lhe que sim com a cabeça, arrumei as minhas coisinhas e, antes que fosse tarde de mais, fui... tentar socializar com desconhecidos.
Afinal, o importante mesmo é socializarmos, não é? Ai eu acho.
Sentei-me num sofazinho do hall de entrada e saquei do papel e do porta-minas. Estive ali a desenhar mais ou menos 5 minutos e, durante esse tempo, o cavalheiro do sofá à minha frente mal se mexeu. Quando as pessoas mal se mexem, isso pode acontecer por dois motivos: o primeiro é porque, na verdade, são estátuas e, o segundo, porque sabem que estão a ser desenhadas.
Neste caso, o motivo foi o segundo. Mal acabei o desenho, o senhor virou-se para mim e exclamou, num tom de voz colocado:
"O sôr..., o sôr é como aqueles dos tribunais!"
Ia eu para responder que sim, quando comecei a pensar. Os tipos que desenham nos tribunais, estão ali para desenhar os, alegados, criminosos. Ora, eu estava a desenhar um homem que me comparou, ele próprio, aos tipos que desenham criminosos, sabendo que eu o estava a desenhar a ele...
Antes que os pensamentos me invadissem ainda mais e atingissem níveis de estupidez nunca antes registados, reuni a mim todas as minhas forças, e, cheio de coragem, olhei o homem nos olhos. Sorri-lhe e acenei-lhe que sim com a cabeça, arrumei as minhas coisinhas e, antes que fosse tarde de mais, fui... tentar socializar com desconhecidos.
Afinal, o importante mesmo é socializarmos, não é? Ai eu acho.
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
30
Andei, durante algum tempo, a convencer-me que fazer 30 anos não ia ser nada de especial. Afinal de contas, é só mais um ano e o facto de ser uma mudança de década não tem nenhum peso especial, certo?
Errado. À chegada ao famigerado dia, a minha cabeça estava mentalizada mas o meu corpo não. Acusou a pressão e espetou-me uma gripalhada como há muito não me recordava. Mas bem, com 30 anos, uma pessoa já tem uma certa maturidade e, com os anos, vai aprendendo a lidar com estas situações.
Iniciei o tratamento com um comprimido de manhã e fiquei em casa a aquecer. Como a coisa não estava a melhorar, decidi aumentar o grau do tratamento. Fui com um amigo a um café e passámos a tarde a beber cervejolas. A ideia era abafar a constipação mas, mesmo com dose reforçada, a sacana continuava a resistir.
À noite, já em esforço, fui ao cinema com a Maria. O prognóstico clínico era já, nesta altura, bastante reservado e exigiu medidas extraordinárias. Sem mais alternativas, foi necessário recorrer, em plena exibição do filme, à ingestão de um poderoso e eficaz... pacote de gomas.
E aí está a prova de que o passar da idade só tem vantagens porque o envelhecimento trás consigo sabedoria. Quando cheguei ao final do pacote, qual constipação qual quê.
Já viram alguém a acabar de levar um murro no estômago a queixar-se por estar ranhoso?
Eu também não.
quarta-feira, 4 de janeiro de 2012
Nunca ignorem um arrepanhar de pescoço
Quando fui com a minha senhora comprar bilhetes para a peça "Quem tem medo de Virginia Wolf" no Teatro D. Maria, a secretária disse-nos que só havia bilhetes para o 2º balcão e, ao dizê-lo, arrepanhou o pescoço. O gesto dela gritava "Venham noutra altura. Estes lugares são horríveis!". Com um sorriso de parvo, que tentava dizer "Já assistimos a imensas peças nesses lugares e são óptimos. Sim, porque nós vamos imensas vezes ao teatro, ou achas que é só hoje porque fazemos anos de namoro?", disse-lhe que queria dois bilhetes.
A senhora imprimiu-os, fez-nos o troco e revirou ligeiramente o olhar, num gesto que percebi perfeitamente que dizia "Estes dois nunca cá vieram, de certeza, mas é bem feito especialmente para o gajo, porque me está a tentar convencer que já cá vieram muitas vezes..."
No dia seguinte, lá fomos nós à peça. Quando chegámos ao balcão do 2º piso, depois de nos instalarmos, recordei por breves instantes aquele arrebanhar do pescoço da senhora que nos tinha vendido os bilhetes.
E sim, foi só por breves instantes. Porque com os 27º de temperatura que lá estavam, com os joelhos a bater na varanda, e a ter que pôr o casaco debaixo do rabo para conseguir ver o palco, tive mais com que me preocupar.
O que vale é que a peça só durou 3 horas...
É verdade, havia uma peça, sim. A história era sobre dois casais a discutir, o que acabou por ser monótono. É que para além das discussões no palco, ainda levámos com as discussões dos outros casais do 2º balcão:
"Vai pedir à senhora para baixar a temperatura!"
"Já fui. Ela diz que não pode poque senão as pessoas da plateia ficam com frio..."
"Mas estamos no Inverno, toda a gente tem roupa quente!"
"Tu também podes tirar roupa..."
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
Sou irritante, mas é para o bem dos outros
Com o ano de 2011, não foi diferente. Foi o ano do voluntariado, e acabei por deixar a minha contribuição para esta bonita efeméride para o último dia do ano.
Mas foi em grande. Com o pessoal lá da terra, tirámos o dia para plantar morangueiros para um lar de idosos. Havia tarefas bem definidas: abrir os buracos no camalhão (é o que se chama ao chouriço de terra, coberto por um plástico preto, onde se vão plantar os morangueiros), pôr o estrume, abrir uma pequena cova, colocar a planta e tapar o buraco.
Eu fiquei na parte de abrir os buracos no plástico.
Como ía à frente, mal acabei a minha parte, fui lavar as mãos e sentei-me num caixote a desenhar os outros, ainda, a trabalhar.
Agora que penso nisso, é capaz de ter sido um bocadito irritante. Afinal de contas, já eram quase 5 da tarde do dia de passagem de ano, estava tudo cansado e sujo de lama, tudo deserto por se despachar para ir tomar banho e arranjar para a festa, ainda havia para aí 200 morangueiros para plantar, e há um tipo que vai lavar as mãozinhas e sentar-se a fazer uns desenhinhos dos outros a trabalhar...
Geralmente, e digo isto por experiência própria, as pessoas aguentam 2 desenhos até lhes saltar a tampa. Neste caso, talvez imbuidas pelo espírito da boa vontade, a tampa só saltou mesmo no final do 3º desenho.
Não haja dúvidas: o voluntariado torna mesmo as pessoas mais bonitas. E pacientes.
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