quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Vou enviar o meu CV à Carris


Aqui há tempos, ia eu no eléctrico a atravessar a baixa de Lisboa, quando entram três tipos no eléctrico, dos seus 50 anos, óculos escuros, mapa de Lisboa na mão, roupinha da Dolce e Cabana e Lagoste, calçado Nice e Abibas – eram gatunos, não havia a menor dúvida.
Passaram grande parte do tempo a olhar para todos os passageiros até que, estava eu quase a chegar ao meu destino, começam a cercar um velhote no corredor do eléctrico. Se o velhote tivesse ar de representante da troika, como o outro que eles assaltaram, eu ainda fazia claque. Aliás, ainda era menino para lhes ir dar uma ajudita. Mas o homem de rico não tinha nada e aquilo estava-me a custar.
Eu tinha que fazer alguma coisa para impedir aquilo. Mas o quê? Gritar “Gatunos! Chamem a polícia!” só ia fazer as pessoas pensar que estava algum político para entrar no eléctrico. Dar um pêro num deles era contra os meus princípios. Sou contra a violência física, especialmente quando vejo que o mais certo é ela vir parar, ao triplo, ao meu corpinho. Se ao menos não tivesse feito a barba de 2 meses nesse dia, caramba…
Foi então que me lembrei do acto mais heróico que poderia ter. Um acto de valentia só ao alcance de verdadeiros heróis, modéstia à parte. Um daqueles feitos que nos põe o Hino de Portugal a tocar dentro da cabeça e a bandeira nacional a esvoaçar por trás.
Sim, isso mesmo. Peguei em mim e fui-me pôr ao lado do velhote. Ok, foi só isto.
Mas o Hino Nacional a tocar deve ter desconcentrado os tipos porque mal estacionei ao pé do velhote, o gatuno que estava atrás de nós disse ao da frente estas simples palavras, que nunca esquecerei: “Come o velho, pá! Come o velho!”
A réstia de dúvida que pudesse existir sobre a seriedade daqueles cavalheiros desapareceu ali. A única hipótese de eu estar enganado era se um deles tivesse um saco com pão fresco e pão do dia anterior e o outro estivesse a dizer para comer primeiro o velho. Ainda procurei com os olhos, mas nada. Era mesmo do velhote ao meu lado que estavam a falar. E não, também não era com um ar romântico que o estavam a dizer.
O problema, é que estava lá um gajo armado em parvo que era preciso que saísse dali primeiro. Com toda a simpatia, disseram-me vinte e quatro vezes que eu podia passar, até me arranjaram um canto mais espaçoso para eu ir e tudo. Dei um passito para a frente, só para queimar tempo até à paragem e eles devem ter percebido que era melhor desistir dali. Se há coisa que sei fazer bem é ser chato.
Na paragem seguinte saímos e fiquei a perceber porque é que os super heróis são pessoas tão amargas – nem uma salva de palmas, nem os parabéns, nem notas de quinhentos euros, nem roupa interior feminina atirada aos meus pés, nada...
Mas como a coisa correu bem, estou a pensar vender os meus serviços de estorvador de roubos à Carris. Arranjo um fato como o Batman, ponho uns chumaços e aí vou eu estorvar quem estiver a prevaricar dentro dos eléctricos. No metro já há uns gajos destes. Chamam-lhes, como é que é, ah…., já sei – polícias.
Como na Carris parece que ainda nunca ouviram falar desses tipos, vou ver se faço negócio.

11 comentários:

  1. Temos herói! Fossem todos assim e seria tudo um pouquinho mais cor de rosa!

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  2. Sem dúvida alguma que tiveste um gesto muito bonito e nobre... esses ladrões rascas dão-me nojo. E os não-rascas também.

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  3. Gostei muito da aventura! E ainda mais da descrição! :D

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  4. Mas devias ter desenhado os larápios e entregue a foto robot à polícia ou posto aqui, para toda a gente ver! Deixaste o trabalho a meio, homem!

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  5. Se eu tivesse lá aplaudia, mesmo que fosse um dos ladrões! :P

    Sim senhor, tiveste bem. Vou apontar no meu livrinho quem contratar quando precisar de um guarda costas, ou guarda lateral :)

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  6. Vê lá é onde é que depois pões os chumaços.

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  7. Tu tem cuidado com essas coisas que um dia ainda te metes em trabalhos. Mas foi bonito sim senhora :)

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  8. Silvana, cor-de-rosa ou assim mais para o negro, se a coisa não tivesse corrido bem... :)

    S*, nojo é a palavra certa. Só de olhar.

    Hugo, ia sendo uma valente estupidez!...

    Filha, obrigado!

    Lois, obrigadinho! :)

    Hugo, não sei se o suor dos dedos me permitiria tal tarefa. (aquilo foi um bocadito stressante)

    faa aa, só se for esquerdo. Ando a treinar o pé esquerdo a ver se o Benfica repara nos meus dotes.

    Vic, no sítio onde metem mais medo, claro, ;)

    Palco, obrigado!

    C, também já me fartei de ouvir das boas da Maria... :)

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