Depois de um período em que tive muito trabalho (que me impediu de ter a paz necessária para escrever aqui), e depois de outro período de algum desânimo em relação ao blogue (
por ter um trabalho desgraçado com isto e não ganhar nada ao fim do mês com esta gaita acho que muita gente que escreve em blogues passa por isso), decidi que só recomeçaria a escrever aqui quando acontecesse alguma coisa grandiosa na minha vida que merecesse ser contada.
Nestes quase 3 meses que pouco escrevi, várias foram as situações em dei comigo a pensar: será que isto que acabou de acontecer é grandioso o suficiente para escrever no blogue? E, a resposta, era sempre "humm... não...". Ainda fiquei na dúvida se haveria de escrever sobre a vez em que a minha irmã mais nova foi ao "Quem quer ser milionário" e, numa das perguntas, usou a ajuda do telefone para me ligar. Eu, que estava de sobreaviso e tinha todos os sites de cultura geral possíveis e imaginários abertos no pc, não cheguei a conseguir falar com ela porque a chamada do programa me foi posta em espera, enquanto a Manuela Moura Guedes dizia à minha irmã que eu não atendia. Estive quase para escrever sobre isso, mas como, depois de eu ter berrado ao telefone com a telefonista a perguntar como era possível aquilo ter acontecido e ela me ter garantido que era impossível - e eu é que tinha tido algum problema no telefone, fiquei mais descansado.
Até que, na semana passada, me aconteceu uma daquelas coisas em que o meu primeiro pensamento foi: tenho que falar disto no blogue. E costuma ser bom quando isso acontece - ou é uma coisa muito boa ou é uma cromice do catano. E não, o que aí vem não foi uma coisa muito boa...
Então, ora cá vai. Vinha eu de regresso a casa,
de carro no meu formidável
Peugeot 206, e estacionei no parque do prédio. Ao trancar o carro com a chave (quando comprámos o carro só trazia um comando e ficou, claro, para a senhora da casa), reparei que o fecho centralizado não tinha funcionado. Experimentei outra vez e nada. Tentei na porta do pendura e... nada. Entrei novamente no carro, meti a chave na ignição e nem uma luz se acendeu no painel. Aquilo eram problemas na bateria, certamente. O que vale, é que desde os tempos do velhinho
AX que eu e a Maria andamos sempre com cabos de ligação da bateria na mala. Tirei-os e chamei-a para ressuscitarmos o
bolinhas extraordinário veículo automóvel.
Fizemos a ligação a outro carro a trabalhar (já somos pro nessas cenas) e... nada. Nem sequer uma luzinha - nada. Ainda tentei desligar a chave e voltar a ligar o carro (no computador funciona sempre) e nada. Mesmo com os cabos ligados a outro carro a trabalhar em ponto morto,
a carripana o bólide ficou em completa escuridão e silêncio.
Lembrei-me, então, de ver se os cabos entre os carros estavam bem ligados ao outro carro (a Maria é que estava a olhar para os cabos como uma... burrinha (das fofinhas, vá), a olhar para um palácio) e, ao sair do formidável... veículo, "trák"! A bateria tinha voltado e o fecho centralizado tinha actuado, fechando as portas do carro, com a minha chave na ignição. Olho para a Maria para lhe pedir a chave dela, com um sorriso de vitória na cara, quando a vejo, em desespero a olhar para a mala dela, em cima da porra do banco do pendura da
chocolateira viatura. Ao que parece, aquilo é uma espécie de dispositivo de segurança. O carro tranca-se se alguém lhe desligar a bateria e voltar a ligar, porque é provável que sejam ladrões. Ali, tinha sido o próprio
ferro-velho carro a desligar a bateria e a ligá-la novamente, o que só comprova que ele tem vontade própria. Vontade própria e um ego do caraças. Gostava de saber onde é que ele foi desencantar a ideia de que alguém o gostaria de assaltar...
Depois de passar o pânico inicial, a Maria lembrou-se de pedir uma chave do carro de outra pessoa que fosse a passar para abrir o nosso. Aquilo foi claramente uma ideia parva. Se eu me desse ao trabalho de pedir uma outra chave mágica a alguém, o último carro que iria querer abrir era aquele...
A única solução (credível) que nos ocorreu foi, então, ligar à oficina onde costumamos ir. A resposta do mecânico acalmou-me logo. É engraçado como falar com especialistas faz sempre bem:
- Amigo, pode tentar cortar a borracha de uma janela, enfiar um alicate e puxar o coiso para cima para destrancar o carro mas o mais fácil é partir uma janela.
- A sério, é o único conselho que tem para me dar? - teimei.
Depois de uns instantes, o homem, que era um especialista, disse-me:
- Escolha a mais pequena.
Já a desesperar, fui a casa buscar as ferramentas que me pareceram mais adequadas à ocasião - facas e chaves de fendas. Nada de martelos. Queria experimentar primeiro tirar a borracha que fica entre a porta e a carroçaria, seguindo o exemplo do especialista.
Como
a lata com rodas o automóvel é de 3 portas, as janelas de trás são pequenas e abrem só um bocadinho, com um fecho de compasso. Por isso, lembrei-me de enfiar a chave de fendas entre o vidro de uma dessas janelas e a borracha e fazer pressão para a janela abrir. Enquanto me esforçava, foi tranquilizador ver pessoas a passar ao lado e nenhuma estranhar o que quer que fosse. Às tantas, aquele carro (e seus donos) já são mais conhecidos nas redondezas do que eu pensava...
A janela estava a querer abrir mas faltava uma faca, para conseguir abrir o fecho do compasso da janela através do espaço que a chave de fendas abria. Pedia à Maria que fosse a casa buscar e, quando conseguimos libertar o fecho com a faca da manteiga, pedi-lhe novamente que fosse a casa buscar o alicate para poder enfiar o braço pela janela até ao lugar da frente e puxar o... coiso para cima. Aquilo às tantas já parecia uma cena da Anatomia de Grey, onde eu era o McDreamy (claro) e a Maria era a enfermeira instrumentista. A única diferença é que na Anatomia de Grey, a instrumentista é mais rápida a dar as ferramentas ao McDreamy. Tirando isso, era tal e qual.
Quando, finalmente, a Maria trouxe o alicate, arregacei a manga e enfiei o braço pela janela de trás até ao coiso da porta da frente. Tentei, tentei, tentei mas... não consegui lá chegar. Tanto esforço parecia começar a não compensar. Até que, num rasgo de intelectualidade sem precedentes, a
enfermeira instrumentista Maria desata a correr até casa e regressa, munida com a solução para o nosso problema - um boião XXL de creme hidratante. Esfregou-me o braço todo com aquela mistelanga e foi ver o braço deslizar pelo carro a dentro até ao coiso, entalado entre a janela mal aberta e a borracha. Destranquei o... num instante.
Com o carro, por fim, aberto, fizemos o que se impunha - chamámos o reboque para irmos à oficina, a mesma onde nos mandaram partir a janela. (as outras são muito longe...) O tipo do reboque, que tinha um ar de... tipo dos reboques, sacou do seu "Super Booster" e, entre mastigadelas da sua pastilha elástica, disse-me que aquilo era canja. E, de facto, lá nos pôs o carro a trabalhar. Garantiu-me que ele não iria abaixo e que podia ir à vontade no carro até à oficina e pôs-se ao fresco, que as cervejolas não se bebem sozinhas e o patrão só devia estar a contar com ele uma hora mais tarde.
Já na oficina, pude comprovar que quando se trabalha com técnicos especializados, tudo é mais simples. Só demoraram uma hora a descobrir que um dos cabos que ligava à bateria estava partido. E descobriram só depois de me terem tentado impingir uma bateria nova e terem percebido que ela ainda estava na garantia... deles.
Depois de tudo isto, fiquei a acreditar muito mais na bondade das pessoas. Ok, que são boas ou então que não têm creme hidratante em casa. É que passámos três dias com a janela de trás aberta e o
fantástico veículo carroça não desapareceu.